sexta-feira, 25 de novembro de 2016

DOCE NOVEMBRO


Nas folhas das hortências ouve-se o silencio da ilha
Sente-se a humidade dos olhos de um anjo
Chuva miúda, a respiração das acácias
Já perdi de vista o ardente e talhado rosto de Setembro

Um sino cansado, o tremor da tarde
O regresso de uma saudade
Um copo de destino fresco
Celebrando as núbeis virgens de uma inventada cidade

O cicio e a aura dos segredos
Que ilha descubro nos teus olhos?
Gaivota poisada entre as palavras e o branco rumor do mar
Tu que 7 vezes disseste não me amar

Se falasse das tuas mãos
Diria que afagam o adeus no sentir que fica
Se falasse do teu coração
Diria que arroxa uma incontida paixão

Nas lagoas dançam estrelas breves
No espelho de água, ressoam os passos leves das garças
Nas cume eiras o rumor do musgo
As mãos que soltam borboletas molhadas


Nunca vi a sombra de uma estrela
Aqui o silencio cresce como uma rosa
A tua voz orvalho solto das conteiras
Os teus olhos ardentosos da poesia sem prosa

Por ti
Calquei presságios, soltei sonhos
Regressei de outras infindáveis agitações
Por ti plantei no mar todas as minhas emoções

Como se as gaivotas soubessem ouvir o sonho
Como se te vestisses com a túnica de um anjo
Como se corresses entre o fim da memória e o rumor do mar
Como se não soubesses soletrar o verbo amar

Encontrei-te num jardim de água
Com a cor do medo no olhar
Descalça nas crespas águas da dor
“Nunca sabemos a distancia entre o amar e o amor”

Vi-te crescer nas estações do crepúsculo
Deixando cair na água sementes do olhar
Todos os dias do teu sorriso e voz lembro
...Queres ser o meu... DOCE NOVEMBRO?

sexta-feira, 18 de novembro de 2016

O APANHADOR DE ILUSÕES


Uma vez acordei com uma voz doce
Que me disse:
Desenha-me uma ilusão, uma ilusão
Levantei-me num salto, terei tinta que baste
Neste dorido coração?!

A mesma voz insistiu
Se não puderes, se não souberes
Então: deixa que a tinta tome conta da tua mão
Só tens que deixar sair a paixão

Uns olhos esbugalhados de criança
Trapos tapando o Sol da esperança
`Pés descalços no barro da terra
Um pequeno guerreiro que na vida espera

Nas réstias de luz que confundem o passado
Vi teus ternos olhos a chorar
Vi junto a ti um anjo tocar-te o rosto e sorrir
“Os olhos que choram não sabem mentir”

E pintei o Mundo no gesto sereno e demorado
Pintei com noticias das saudades ausentes
Revelei o paredume invicto das descobertas e labirintos
E a cada pincelada enchi a alma de presentes

Sabem lá as coisas que pintei
Sabem lá como esta alma sentiu o voar
Sabem lá o que fiz para te poder ver
Desde a noite, até ao ruído das gaivotas ao amanhecer

Talvez seja um comovido marinheiro de outras eras
Talvez habite o sitio onde as crianças buscam o sonho
Talvez tenha recolhido do mar um molho de esperas
Talvez tenha ouvido mal palavras sinceras

Só sei que o amor é uma palavra apenas
Que tal como as montanhas que se desfazem devagar
Nem sempre quem o sente é capaz de amar
Penso que o que sinto é diferente, deixem lá, não digo
Eu que até sou um poeta que tem a mania que é gente

Fiquemos por aqui onde há um coração rubro
Batendo ao ritmo das ondas brancas
Chegando-se sempre mais ao calhau redondo
Preso ao mar cheio de âncoras cansadas
Lembremos apenas que a cor não define o objeto
Antes o limita no contexto da paisagem na lentidão dos olhares
Eu hoje só queria falar dos suspiros de pássaros breves
Este...APANHADOR DE ILUSÕES

sexta-feira, 11 de novembro de 2016

A COR PURPURA OU O POETA QUE ENSINOU UMA MULHER A VOAR


Nasceste ao mesmo tempo que o sol
No anunciar da voz mansinha da flor
E nasceu o sonho
A fonte da saudade, o amor

Tenho uma carta que nunca abri
Tenho uma paixão suspensa por ti
Sou um palhaço que nunca ri
Tenho guardado um sentimento que já senti

Por isso, vem apenas
Sem dor, sem penas
Como se não houvesse mais nada
Vem vestida da palavra na voz calada

Mas vem sem perguntares pelo amanhã
Pelos abismos que abrem fronteiras nos nossos corpos
Com a lucidez dos espelhos e a espuma inquieta do mar
Vem apenas com um sorriso de amar

Vem, docemente, como um papagaio de papel-de-seda
Em tardes de vento brando
Fala-me de fadas, de castelos, de gaivotas felizes
Como se fosse-mos apenas aves sobrevoando o mundo

Mas diz-me coisas sobre a verdade
Fala-me de ti, no amor, na vontade
Deixa-me morrer na tua lembrança
Existir na tua inventada cidade

Deixem-me ser levado pelo vento
Como se partisse para sempre
Numa manhã cinzenta com as gaivotas gritando
Nas tempestades desta ilha algures perdida no tempo

Fala-me de um mar
Onde alguma vez pudemos navegar
Como se voássemos no mesmo bater de asas
“Fala-me do significado da palavra amar”


Mas vem, como se partíssemos para sempre
Num novo dia ao encontro dos desencontrados
Num sonho de navios partindo numa viagem sem fim
“Vem com a alma sorrindo em olhos fechados”
Voarão anjos pelos cantos do salão pela minha mão
Vestirei uma capa de cor púrpura para te ver dançar
Serei pois o mais feliz dos homens
Ou apenas...O POETA QUE ENSINOU UMA MULHER A VOAR...

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

NAS MARGENS DO AMOR


Não devo acariciar a melancolia
Algures na entrega de tudo
Está o pouco que se pretende
Não se deixa vencer pela noite este louco

Atrás de todas as vestes
Esconde-se o medo, a escuridão
Nas margens do silêncio habita um pássaro
Este poeta também tem coração

Um homem atravessa a montanha
Faz um filho, ama o retrato, morde o chão
Vende ao longe a esperança, o que Deus quiser
“Só o vazio ocupa o lugar de uma Mulher”

O teu, o teu, o de ninguém...
Com as cinzas da tarde
As mãos e as palavras estenderam-se sobre a mesa
Então de repente surge um grito sussurrante

O teu, o teu, o de ninguém...
Enquanto do tempo não há noticia
Como se de outro mundo viessem
Atrás das portas, as flores escutam-se mortas

E algures sonhamos com o mar
Vestindo um fato negro com a alma ao pescoço
Serei pois uma gaivota sorridente
Ou a sombra de um bêbado coxo?

Nunca serei
Desalento amorfanhado no silencio
Um bailarino rodopiando em salões vertiginosos
O sereno que beija o asfalto

Este lembrar do sol
Este lembrar de ti
Este sentir imenso
Este não saber se parti ou morri


Esta fresta que rasga os olhos
Esta beleza que faz de ti flor
Este poeta que se perdeu
NAS MARGENS DO AMOR...