
Sinto a frescura deste orvalho
Bebi na sede, seca do brilho do Sol
Pisei o pó desta terra estéril
Apanhei no olhar um lago de água feito lençol
Não sei porque as vagas vindas de longe
Transportam este sal que me escorre no rosto
Não sei porque uma lágrima tem o mesmo sal
Que mergulha minha alma no Sol-posto
Espadas que ferem um corpo nu
Pano sem cor, talhado a cru
Chicote de revolta, assombração
Uma prece, uma mágoa, tu
Tu, saberás que as manhãs não podem ser interrompidas
Que um relógio quando pára, foge o tempo
Que a saudade é degredo de todas a emoções
Que a felicidade se mede apenas por um momento
Eu nada sei
Nem sei se soube saber quem sou
Sei sabendo apenas o rumo
De uma alva graça que em mim poisou
Na minha procura de rumos
Encontrei aquilo que penso ser o Graal
Por isso pinto a cada momento
O belo para afugentar o mal
Pintor, alquimista da cor
Crente do amor, companheiro da dor
Anjo perdido entre a terra e o celeste
Pétala esvoaçante de uma rubra flor
Hoje perdi-me na cidade do pensamento
A vida correu-me na frente em corropio
Hoje um pássaro descobriu o voar
Hoje senti na emoção a força de um rio
Segui para nascente fugindo à noite
Inventei um cavalo branco voador
Despi-me da obrigação de ser outro
Afastei da viagem a sombra do desamor
O verde ficou mais verde
As hortências caíram do céu aos molhos
O celeste vestiu-as do mais puro azul
Tudo isto transbordou das janelas...dos teus olhos...