domingo, 23 de maio de 2010

OS TEUS OLHOS


Sinto a frescura deste orvalho
Bebi na sede, seca do brilho do Sol
Pisei o pó desta terra estéril
Apanhei no olhar um lago de água feito lençol

Não sei porque as vagas vindas de longe
Transportam este sal que me escorre no rosto
Não sei porque uma lágrima tem o mesmo sal
Que mergulha minha alma no Sol-posto

Espadas que ferem um corpo nu
Pano sem cor, talhado a cru
Chicote de revolta, assombração
Uma prece, uma mágoa, tu

Tu, saberás que as manhãs não podem ser interrompidas
Que um relógio quando pára, foge o tempo
Que a saudade é degredo de todas a emoções
Que a felicidade se mede apenas por um momento

Eu nada sei
Nem sei se soube saber quem sou
Sei sabendo apenas o rumo
De uma alva graça que em mim poisou

Na minha procura de rumos
Encontrei aquilo que penso ser o Graal
Por isso pinto a cada momento
O belo para afugentar o mal

Pintor, alquimista da cor
Crente do amor, companheiro da dor
Anjo perdido entre a terra e o celeste
Pétala esvoaçante de uma rubra flor

Hoje perdi-me na cidade do pensamento
A vida correu-me na frente em corropio
Hoje um pássaro descobriu o voar
Hoje senti na emoção a força de um rio

Segui para nascente fugindo à noite
Inventei um cavalo branco voador
Despi-me da obrigação de ser outro
Afastei da viagem a sombra do desamor

O verde ficou mais verde
As hortências caíram do céu aos molhos
O celeste vestiu-as do mais puro azul
Tudo isto transbordou das janelas...dos teus olhos...

sábado, 8 de maio de 2010

PENITÊNCIA


Um foguete rasga o azul
Um anjo acorda repentinamente
O incenso vagueia em errante aroma
Uma reza faz-se ouvir perdidamente

Perdi os acordes tangentes do sino
Que ecoaram na madrugada
O Templo teve o calor de mil almas
Em fervor de reza assombrada

Uma vela arde, outra e outra
Chama que guia no caminho da fé
Cruzei sentires com caminhantes
Soltei um surdo grito e pôs-me de pé...

Para ver passar a procissão
Murmurei uma reza de encontro ao andor
Percorri este rio de imensa mágoa
Pedi, o perdoei, que me dará o Senhor

Estranho!
Os pássaros vestiram-se de silêncio azul
Será que o Santo os aprisionou na viagem?
Será que este ano a chuva cairá a sul?

Hoje ofereci as cores da minha paleta
A uma amiga na sua dor
Ouvi seu choro ao meu ouvido
No fatalismo do desamor

Hoje o sono acordou-me
A nostalgia agitou suas asas cinzentas
Esqueci no acordar o ultimo abraço
E contei as nuvens que eram tantas

De joelhos vi gente percorrer um caminho
Por juras e perdão prometidos à muito
Vi sangue sangrando do peito
De uma Mãe de olhar muito aflito

Vejo tanta coisa que ninguém vê
É uma sina tatuada na estrada que piso
O basalto frio toca-me em arrepio
Neste mundo às vezes paro, outras deslizo

Para onde terei eu mais que ordenar o passo
Há um combate em mim de raiva e sapiência
Coloco as mãos postas e ergo este cálice
E verto toda a paixão desta...Penitência...