sexta-feira, 30 de setembro de 2016

A FLAUTA MÁGICA


A corrente miúda das ribeiras
A gaivota repentina
O suor deixado no arraial
Uma dor de amor que não se leva a mal

Olhei de soslaio para uma prateleira branca
Um gato de cor laranja piscou-me o olho
Peguei nele, levei-o comigo
Ofereci a uma Princesa de pouco mais de um ano

Alice numa ilha encantada
Um chapeleiro louco tomando chá de orvalho
Ofereço, rasgo, dou ou deito fora
Tudo isso e mais a fome de ser feliz
No rasto do homem navalhado
Uma mulher que me sorri com os lábios tortos de dor
É por isso e pelos versos
Por estas mãos sempre em construção
É por ficar tão longe do meu
Este teu fugidio coração

Às vezes louvo o amor
Não conheces decerto
Este poeta escaldado da ternura
Estive de ti sempre tão perto

Nas tardes condescendentes da ilha
Recolho as palavras na hipnose dos sons
O balanço do pensamento que na noite respingou
A pureza silenciosa de uma flor
No cerne imperceptível do papel branco
Deixei o teu nome mais a palavra amor

Entrando dentro de mim ri-se o homem mais infeliz
Este caminhante viageiro
Uma menina chora mais ao lado
Um leão, um gato amarelo

Percorro este caminho só
A noite aproxima-se hesitante
Não há nenhum barco para partir
A dor desce e de repente é noite

Um piano que me sacode a alma
Enquanto escrevo este poema
Passei a noite numa viagem fantástica
Sonhei ser o tocador da... FLAUTA MÁGICA...

2 comentários:

luar perdido disse...

A flauta que os anjos levam aos lábios, devagar, para que o som não assuste as almas em busca, sabe-se lá de quê, sabe-se lá de quem.... Mas em busca. A mesma flauta que faz vibrar o coração, (seja de homem navalhado, ou de homem perdido em amor magoado), e que diz, na calada da noite, que há um mar por percorrer, e um céu por ver aclarar. Que há uma noite por acalmar a dor do silencio e de uma partida num cais deserto, onde já não há barcos a partir...Nem, ainda, a chegar.
Para conhecer o poeta "escaldado da ternura", é preciso ser-se bruma fresca da manhã, ou golfinho atrevido, que vem espreitar por entre as ondas de um azul profundo. Ou ser a roseira bravia que floresce, teimosamente, ao alcance da tua mão, para que esse caminho não tenha que se percorrer só. Feliz a princesinha, que, embora apenas com um ano, tem agora um gato amarelo e um sonho a que dar vida. Felizes as teclas desse piano que sacode a alma que é capaz de tão belo e profundo poema...
Divinal, profeta das odoras brumas de cor de hortênsias adormecidas. Divinal!! Como sempre.
Beijo de luar

Estrela Florescente disse...

Li calmamente e entusiasmada.